Festa do Corpo de Deus: chamamento de Cristo e grito do crente
22 Junho 2014
“Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que vem da boca de Deus” (Mt 4, 4). Para haver pão para todos, primeiro é preciso que o coração do homem seja alimentado. Para haver justiça entre os homens, tem de crescer a justiça no coração, e ela não cresce sem Deus, nem sem o alimento fundamental da Sua Palavra. Esta Palavra fez-se carne, fez-se homem, para que apossamos receber, para se poder tornar nosso alimento. (…) Deus fez-Se pequeno para Se poder tornar nosso alimento, para podermos receber amor do Seu amor, e para que o mundo se tornasse no Seu Reino.
Na festa do Corpo de Deus, o que está em causa é toda esta textura de relações. Levamos o Senhor pelas ruas das nossas cidades e aldeias fora, o Senhor feito carne, o Senhor feito pão. Levamo-l’O para a nossa vida de todos os dias. (…) Ele não pode viver ao nosso lado enclausurado no Sacrário, mas no nosso meio, no nosso dia a dia. Para onde quer que vamos, Ele deve ir; onde quer que vivamos, Ele deve viver. O mundo, o dia a dia deve tornar-se no Seu Templo. O Corpo de Deus mostra-nos o que significa comungar: acolhê-l’O, recebê-l’O com a totalidade do nosso ser. Não se pode simplesmente comer o Corpo do Senhor da mesma maneira que se come um pedaço de pão. Só é possível recebê-l’O, quando a Ele nos abrimos com toda a nossa vida.(…). “Olha que eu estou à porta e bato”, diz o Senhor no misterioso livro do Apocalipse. “Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei nele, comerei com ele e ele comigo” (Ap 3, 20). A festa do Corpo de Deus também quer tornar audível à nossa surdez interior o rumor do Senhor à nossa porta. Através da procissão, Ele bate sonoramente à porta do nosso dia a dia, e pede-nos: “Abre- Me a porta! Deixa-Me entrar! Começa a viver de Mim!” Não é coisa para acontecer de um momento para o outro, rapidamente, durante a missa, e a seguir deixar de acontecer. Trata-se de um processo que atravessa todos os tempos e lugares. “Abre-me a porta – diz o Senhor – como Eu Me abri a ti. Abre-Me o mundo, para que Eu possa aí entrar e possa iluminar a vossa mente enviesada. (…). Deixa-Me entrar” – é o que Ele nos diz a cada um de nós (…).
O Corpo de Deus é para nós, portanto, um chamamento do Senhor, mas também é um grito que nós Lhe dirigimos. Toda está festa se resume a uma grande prece: dá-Te a nós. Dá-nós o Teu verdadeiro pão. (…)
(1) Joseph Ratzinger, A Caminho de Jesus Cristo, Edições Tenacitas,
Coimbra, 2006, pp.103-104.