Cristãos são essenciais para o futuro do Médio Oriente

patriarca_gregorioO patriarca sírio Gregório III Laham, líder greco-melquita de Antioquia, passou por Portugal a convite da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS) para deixar um apelo em defesa da paz e da liberdade religiosa

Agência ECCLESIA (AE) – A sua visita a Portugal acontece num momento em que a violência aumenta na Síria. Como analisa esta «guerra sem rosto» que tem vindo a denunciar?D. Gregório III Laham (GL) – Falamos de um conflito que provoca vítimas de forma contínua. Tenho dito, de facto, que esta é uma guerra sem rosto, uma guerrilha sem rosto, não sabemos o motivo desta guerra. Temos democracia como no mundo árabe e melhor do que no mundo árabe; há serviços secretos em todo o lado, por vezes há tortura, corrupção – não estamos no melhor dos mundos, mas também não estamos no pior e eu pergunto: o que é que esta guerra nos pode trazer? É verdadeiramente, como se diz na Europa, uma primavera árabe pela democracia, a liberdade de religião, de culto?Não vejo o que este grupo, que se diz oposição, nos pode trazer. E se houvesse uma verdadeira oposição, que diríamos moderada… Pelo contrário, há oposições, completamente divididas. Segundo Kofi Annan e Lakhdar Brahimi (enviados da ONU para a Síria), com quem me encontrei em 2013, há dois mil grupos que combatem na Síria.

Não podemos esperar que dois mil grupos façam Democracia: estão divididos, querem dinheiro, repartem entre si o dinheiro, não têm programa. Não são uma alternativa, não há uma alternativa.

Eu não quero o regime, quero um Estado: há um Governo, há uma tradição síria de convivência, de liberdade religiosa e de culto, de procissões, de peregrinações, de confrarias.

AE – De que forma vê o crescimento do chamado Estado Islâmico?

GL – O Estado Islâmico não é nem Estado nem islâmico, como me disse um mufti [pessoa a quem é reconhecida autoridade em assuntos relacionados com a da lei islâmica, sua aplicação e interpretação]. Não é islâmico porque não representa o Islão, essa é uma vontade, mas eu penso que tudo isto é, antes, uma instrumentalização.

A desinformação, a manipulação desempenharam e desempenham ainda um grande papel nisto. Os media apresentaram as coisas de forma completamente diferente da realidade e não sei se na Europa há informação sobre a manipulação, se isso se sabe.

Há um objetivo que para mim não é claro. Nesta guerra na Síria e agora em parte do Líbano e no Iraque – onde houve uma campanha militar mal fundamentada -, há todo um mal, que eu denomino ‘mysterium iniquitatis’, o mistério do mal.

Também o vemos numa Europa cada vez menos cristã, que se diz de raízes cristãs mas onde há uma tendência de não o afirmar. Isso é grave. Há uma Europa que já não está na sua forma cristã: um mundo sem Deus é um mundo onde não há valores para o homem, como disse Bento XVI.

Muitos destes mercenários, destes guerrilheiros que estão agora na Síria, com o Estados Islâmico, esta gente que combate são pessoas que perderam o sentido da vida, do homem, da dignidade do homem. Se não são muçulmanos, se são cristãos, pessoas que se converteram ao Islão com a internet, o que é que podemos esperar deles. Que formação muçulmana é que têm? É um alibi, portanto, um alibi, e para mim é um instrumento.

O Daesh – Estado Islâmico do Iraque e do Levante ou Estado Islâmico do Iraque e da Síria, como vocês lhe chamam – é um instrumento. Não sei como é que de repente têm 15 milhões de pessoas sob a sua jurisdição, na região onde estão presentes. Têm um território de 40 mil quilómetros quadrados. É algo que se tornou tão grande que não é verossímil e é por isso que digo que está instrumentalizado.

Eles são um perigo mesmo para o Islão e por vezes ainda mais para o Islão do que para o Cristianismo. Isto não será um complô contra o Islão? Para mim, de uma forma ou de outra, é um complô para destruir o Islão desde o interior, despojá-lo, dividi-lo e, mais ainda, é um movimento sem valor.

Por isso, a atual coligação de alguns países contra este ‘Estado Islâmico’ é insuficiente. Dado que é limitada e dividida, vai gerar ainda mais divisões, mais guerra. Se quisermos um verdadeiro remédio, é preciso que haja um consenso, um acordo geral de todas as partes e de todos os países do mundo e não apenas alguns, sejam países europeus ou árabes.

 

AE – O que tem faltado para chegar a este acordo?

GL – Se estamos verdadeiramente a falar de um perigo para a humanidade, é preciso que todos os países, a Rússia, a China, o Japão, os Estados árabes – porque é que só a Jordânia, a Arábia Saudita e não os outros? Onde estão Omã, Barém, Tunísia? Se é um perigo, é preciso que todo o mundo esteja de acordo, porque se não houver um consenso geral, isso vai causar ainda mais guerra, mais vítimas e mais horror.

Este consenso geral tem de dar resultados do ponto de vista militar, mas sobretudo ideológico, para que haja uma ideologia comum ao mundo e não apenas a uma parte.

 

AE – Essa ideologia exige uma laicidade do Islão?

GL – Sim, é por isso que eu peço uma frente comum, local. Já fizemos reuniões dos patriarcas cristãos orientais, não apenas os católicos, desde junho, para formar uma visão comum e assumir posições comuns. Visitamos juntos o Iraque, Washington (EUA) e temos outras programadas, há uma frente comum, cristã, que ajudar a compreender melhor a situação.

Eu fiz um apelo ao mufti do Egito, o maior país islâmico e também o maior país cristão do Médio Oriente, com 15 milhões de coptas, para que convocasse uma reunião de muftis e patriarcas para criar uma frente comum. É muito importante ter esta espécie de cimeira espiritual, inter-religiosa, cristãos e muçulmanos juntos para mostrar onde nascemos e dar a verdadeira posição sobre o ser humano.

Há um trabalho neste sentido, para que haja uma cimeira espiritual, o que poderia ajudar a criar um consenso universal, a começar pelo Islão – porque há o Paquistão, não é só o mundo árabe – e o mundo europeu, para compreender melhor o desafio e o perigo deste momento.

 

AE – O Papa Francisco tem dado uma atenção muito particular ao Médio Oriente.

GL – Sim, sim. Já quando o Papa São João Paulo II foi à Síria em 2001, havia um novo presidente [Bashar al-Assad, que continua a ser chefe de Estado], filho de Assad, que o recebeu dizendo: ‘Bem-vindo à Síria, berço do Cristianismo’. Tiro-lhe o meu chapéu.

É uma verdade histórica, mas é bom ouvi-lo da boca do presidente de uma república árabe. Gostamos de ouvir o Papa Bento XVI e o Papa Francisco que não se pode compreender o Médio Oriente sem os cristãos e a necessidade de manter os cristãos nos seus locais de origem, também é bom citar um presidente que disse isso, é um testemunho muito importante para mim.

Por outro lado, vemos uma certa abertura: a nova Constituição do Egito tem 25 pontos que favorecem os cristãos, as outras minorias, as mulheres, a família, os Direitos Humanos. Nessa Constituição é dito que a civilização egípcia é, em primeiro lugar, faraónica, depois cristã e em terceiro lugar muçulmana. Tudo isso mostra como é importante a presença cristã.

O Papa Francisco repete muitas vezes a expressão “a minha amada Síria”, é muito bonito. Tudo isso é muito importante, é preciso compreender a importância da presença cristã e do nosso papel. Para mim, defender a presença cristã no Médio Oriente – na Palestina, na Síria, no Egito, no Iraque – é bom, mas essa presença tem em vista uma missão.

Nós queremos conservar a presença cristã, ajudar os cristãos a ficar – agradeço à Ajuda à Igreja que Sofre, aos cristãos de Portugal, obrigado por tudo -, mas peço sobretudo aos cristãos da Europa a não se defenderem apenas a presença dos cristãos, mas a ligar a presença à missão e a missão à presença. Digam: ajudamos os cristãos para que continuem a permanecer no mundo árabe, como fermento na massa, como luz e sal.

Este é o acento: se falarmos apenas em ajudar os cristãos, nos cristãos perseguidos, isso reflete-se numa mentalidade de gueto. Peço sempre que não se fale demasiado nas perseguições, para não criar uma mentalidade defensiva, de pessoas vencidas. É preciso dar coragem aos cristãos para ficarem, com uma missão, senão vai dizer-se: os cristãos da Europa ajudam os cristãos do Oriente, é uma cruzada, ajudam-nos contra os outros.

No berço do Cristianismo, há uma Igreja que fala de Jesus, que dá o Evangelho, que o vive num contexto muçulmano. São João Paulo II já tinha dito que a essência do homem é ser “com e para”. Nós somos cristãos no Médio Oriente com os muçulmanos, estamos num país árabe, de maioria muçulmana. Somos uma Igreja com os outros e para os outros.

É uma Igreja que gosto de chamar ‘Igreja dos árabes’. Ainda mais, forçando, chamo-lhe a ‘Igreja do Islão’. Não é uma Igreja formada por muçulmanos convertidos, não é só isso, é uma Igreja que está em relação e deve levar Jesus ao Islão, de forma especial, não apenas pregando – como fazem alguns grupos protestantes, que fazem mal. É preciso, como disse o Papa Francisco, que o Cristianismo seja atraente, atrativo: esta é a verdadeira missão.

Mesmo que os países europeus tivessem hoje leis que são contra o Cristianismo, o cristão teriam de ter a coragem de viver como português e como católico. Esta coragem não é apenas para o cristão que vive no mundo muçulmano, mas também num mundo demasiado secularizado, ateu ou, digamos, contra a Igreja.

No Evangelho é dito que ‘Deus amou tanto o mundo’. Na liturgia de São João Crisóstomo, dizemos: ‘Tu amaste o teu mundo’. Para mim, cristão, Portugal é o meu mundo, a Arábia, o Líbano, a Síria são o meu mundo, que tenho de amar, levando os meus valores cristãos. É a minha mensagem para os meus amigos em Portugal.

É preciso ajudar os cristãos a manter a sua identidade, como disse o Papa aos jovens no Brasil, com abertura. Este é o adágio: identidade e abertura.

 

AE – Quais são as principais necessidades dos cristãos na Síria?

GL – Há mais de seis milhões de deslocados no interior do país e dois ou três milhões de refugiados, incluindo cerca de 450 mil cristãos, ou seja, 25% dos nossos cristãos estão fora da Síria. Eles são corajosos, resistiram durante três anos e meio, a tragédia da Síria tem uma duração mais longa e o choque da fuga dos cristãos é menos forte do que a do Iraque, num tempo limitado. Mas é mais grave, no nosso país, até porque já recebemos um milhão e meio de refugiados iraquianos que partiram, entretanto.

Outra estatística importante para os nossos amigos na Europa: há entre 91 a 100 igrejas destruídas ou danificadas, de todas as comunidades cristãs. Há mais de 25 aldeias que ficaram sem habitantes cristãos, também.

A Igreja está ao lado do povo, ninguém fugiu: todos os bispos ficaram no seu lugar, todos os patriarcas estão em Damasco. Cada igreja transformou-se num centro de ajuda, todas. Agradecemos a todas as comunidades que nos ajudaram, às agências humanitárias de todo o mundo.

Aos poucos, vemos sinais positivos: Maalula ficou vazia em setembro de 2013 e um ano depois 200 famílias voltaram a entrar. Agora temos um jardim de infância, uma escola, e comecei a reconstruir as igrejas.

Em Homs, o centro está destruído – foram seis meses para remover os destroços, seis meses. Ainda não começamos a reconstruir, mas a igreja está lá e no próximo dia 28 vou inaugurar a reparação. São pontos positivos.

É preciso reconstruir igrejas, centros de catequeses, apoiar as pessoas na reconstrução. As prioridades são ajudar imediatamente, e depois participar, quando as pessoas regressarem, com o Estado, na reconstrução das suas casas: diria que 2 ou 3 mil dólares, por exemplo, para famílias pobres. É preciso que a Igreja se prepare para isso, que a Igreja participe e que os cristãos sintam que a mão da Igreja está lá: é uma mão bela, estendida, que ajuda, a mão do bispo, a mão do patriarca.

É preciso que as organizações cristãs ajudem a Igreja local: cada padre, cada monge, todos os que trazem o hábito são um centro de ajuda.

Eu sinto que as pessoas estão traumatizadas, sobretudo os jovens, as crianças, mesmo sem o sentirem. Então, como ajudar a enfrentar este problema? Neste momento, estou à procura de saber como fundar pequenos centros, pequenos clubes, para ajudar de forma direta e indireta, a diminuir, digamos, estes traumas nas nossas aldeias, nos nossos fiéis, nas nossas gentes, nas nossas escolas.

Quem sabe se em Portugal há pessoas que nos leiam e que tenham um conceito interessante do que se pode fazer na reabilitação, na diminuição do trauma nas nossas crianças?

São pequenos projetos que podem mostrar que a Igreja está junto das populações que estão feridas.

 

AE – Teve oportunidade de participar na assembleia extraordinária do Sínodo dos Bispos sobre a família. Que avaliação faz dos trabalhos?

GL – Esta assembleia serviu sobretudo para desbravar terreno. Os bispos da Europa, da Ásia, da África, do Médio Oriente, da América, vivem a família, sabem qual é a situação nessas regiões. Abordamos os problemas, os desafios, mas não quisemos dar remédios, soluções, propostas, como é costume fazer: deixamos isso para um período de reflexão, nos vários países, e depois a partir desta reflexão vamos apresentar ideias que possam ajudar a definir uma nova linha, entre a continuidade e a novidade. É um pouco o dilema: como abrir-se às famílias em sofrimento, em dificuldade, dando-lhes ao mesmo tempo o Evangelho; como estar aberto às situações e, sobretudo, ajudar as famílias a sair dessas situações, porque não se trata apenas de as compreender. É preciso ajudá-las, onde elas estão, a converterem-se, a mudar de visão.

Não insistimos muito nisto, do meu ponto de vista é preciso compreender as situações, perceber porque é que as pessoas chegaram a esse ponto, mas não deixá-las no mesmo lugar. A Incarnação fez isso: Deus fez-se homem, mas não deixou o homem em baixo, elevou-o.

Compreendendo as situações dos divorciados, de convivência sem casamento, não as posso deixar no seu pecado, há outro valor cristão: se tu és cristão, aqui está o valor. É preciso combinar a doutrina da Igreja, a situação das pessoas, a continuidade e a novidade, o diálogo, o contacto contínuo. Nunca podemos deixar ninguém sozinho, a Igreja não pode deixar uma pessoa só, mesmo no período de sofrimento, mas também não a pode deixar ficar ali, é preciso mostrar-lhe outro caminho. Jesus disse: ‘Eu sou o Caminho’. É preciso dizer a quem está num sofrimento terrível que há um caminho, que há uma verdade. É um desafio para a família e para a Igreja.

OC

In http://www.agencia.ecclesia.pt/

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